#5: 19/04/17

– Moça, você sabe onde tem um Banco do Brasil?

No fone de ouvido tocava Your Song na versão Moulin Rouge. Eu viajava longe, para o dia do meu casamento, pensando usar exatamente essa música, nessa versão, para a entrada da noiva. Desci desse trem e tirei logo os fones de ouvido para responder à senhora que queria saber onde era o Banco do Brasil.

E eu lembrava?

– Aqui embaixo tem um, é só descer dois quarteirões. Ou melhor, só um. É logo aqui embaixo.

Ela agradeceu.

Ia colocar meus fones de novo e apressar o passo, indo na mesma direção que ela, mas a senhorinha fez que ia falar mais. Como tenho essa estranha mania de dar papo para todo mundo, acolhi a conversa.

– Moro em BH tem quatro anos, não sei andar muito aqui. Mas quando enfio na cabeça que quero ir a algum lugar, eu me viro.

– Tem que ser assim mesmo! De onde a senhora é?

– Sou do Pará, de uma cidadezinha que faz divisa com o Amazonas. Ou seja, sou de mais longe que Belém do Pará!

– Nossa, veio de longe mesmo!

– Pois é. Eu tinha um sonho de vir pra cá e vim. Quando a gente tem um sonho, tem que perseguir. Tem que acreditar na misericórdia divina e correr atrás. As coisas ainda não estão fluindo do jeito que eu esperava, mas tenho fé que elas vão dar certo.

Pensei por dois segundos nos meus próprios sonhos e cheguei à conclusão que ela tinha razão. Ia dizer algo do tipo, mas ela se apressou em continuar:

– Sabe, eu acho que quando você sai da sua cidade, buscando um sonho, não tem porque voltar pra lá. É bobagem. Você tem que conseguir o sonho. Depois você volta, só pra visitar.

2003.

14 anos atrás.

O ano em que deixei São João del Rei para perseguir sonhos. Apesar de não ter voltado, ainda, ultimamente andei pensando bastante em me mudar para lá… será o que a senhorinha diria se eu a contasse isso?

Nem comecei a história porque não ia dar tempo de terminar.

– É aqui o Banco do Brasil!

– Ah, que bom! Vou ver se tem um dinheirinho do PASEP pra receber. Já faz tempo que aposentei, mas quem sabe, né? Não vou lá pra roubar, só perguntar se tem algo que é meu por direito.

– A senhora tá certa. Espero que tenha algum dinheiro lá, te esperando!

– Obrigada, minha filha. Tenha um bom dia.

– Obrigada a senhora.

Não vou saber nunca se ela entendeu de fato pelo que eu lhe estava agradecendo, sequer se ela ouviu. Mas senti que o universo me deu de presente três longos minutos de sabedoria.

Dois quarteirões abaixo, outra senhora, um pouco mais velha que a primeira, interrompe novamente meus fones de ouvido.

– Você sabe onde fica a Rua Gonçalves Dias? Número 85.

– A senhora já tá nela. Para ir até o número 85 basta subir mais uns três quarteirões.

Sentindo que vinha por aí mais um bom papo, aguardei sua reação.

– É, eu já estive lá. Mas só queria checar mesmo. Obrigada!

Dessa vez respondi “de nada” e, no fundo, lamentei não ter outra conversa significativa.

Mas não se pode ter tudo… e, às vezes, uma única lição de vida por dia seja mais que suficiente.

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