É muito difícil ler Lewis Carroll em inglês. Novidade nenhuma: estamos falando de um escritor do século XIX, ainda que seu trabalho mais conhecido (justamente Alice no país das maravilhas) seja muito atual. A obra de Carroll sobrevive ao tempo e encanta gerações a ponto de se eternizar em tatuagens, memoriais e esculturas pelo mundo afora.
Além disso, as frases desse clássico – “se você não sabe para onde está indo, qualquer lugar serve”, “eu era uma pessoa diferente essa manhã” e “somos todos loucos aqui”, entre outras – são tão emblemáticas quanto “o essencial é invisível aos olhos”. Assim, não importa se você nunca leu o livro ao qual a citação pertence, uma vez que sabe exatamente de qual livro estamos falando.
Mas até essas frases, no inglês original de Carroll, se emaranham em longos diálogos de difícil compreensão. Não me entenda mal: é um prazer – e uma honra – ler um autor tão importante em sua língua-mãe, e com as especificidades de sua época. Contudo, pode ser necessário ler a mesma passagem duas ou três vezes para que a gente se certifique de que leu direito.
Mesmo porque, na maior parte dos versinhos e charadas (e são muitos!), os trocadilhos e referências são típicos da Inglaterra do século XIX. Quem não viveu naquele tempo, ou não tem o inglês como língua nativa, pode acabar encontrando as dificuldades que eu tive em minha experiência.
Resuminho de Alice no país das maravilhas
A maioria de nós já conhece o fio condutor da história de Alice no país das maravilhas: entediada no jardim, Alice segue um coelho até a toca e, ao cair lá dentro, descobre um outro mundo, tão misterioso quanto peculiar.
Em meio a bichos falantes e seres fantásticos obcecados por charadas, a menina deve manter sua diplomacia (e, na medida do possível, sua in/sanidade) para sair viva da aventura, já que uma certa Rainha anda ávida por ver sua cabeça rolar.
A obra de Lewis Carroll pode ser vista por muitos ângulos diferentes: um conto infantil de fantasia, um manifesto político, um quebra-cabeça lógico… O meu parecer, por exemplo, foi o de que talvez o autor estivesse em uma viagem de ácido quando pensou nisso tudo.
Porém, acho que essa não é a explicação mais plausível, já que Carroll era um reverendo e, para tal função, andar doidão não era uma boa ideia. ;p
O que se sabe, de fato, é que a inspiração para a história foi uma criança de verdade. Seu nome era Alice Liddell e Carroll a considerava sua amiga, ainda que ela só tivesse dez anos enquanto ele tinha 30. Meio esquisito, né?
O que nos leva ao próximo tópico:
Relação entre Carroll e a pedofilia
Já ouvi e li várias versões que explicam o encantamento de Carroll por crianças. A pior de todas, sem dúvida, é sua (não tão) velada pedofilia. Não há nenhum registro ou referência na história de abusos sexuais cometidos por Carroll, mas isso não significa que o inglês não tenha passado uma vida sob a sombra dessa possibilidade.
Essa teoria pode ter dado início a outra versão que já ouvi: a de que Carroll fazia histórias infantis para aplacar seu desejo sexual inapropriado.
Seja como for, em Alice no país das maravilhas não consegui ver nada que pudesse dar à criança, seja a própria Alice ou qualquer outra, uma faceta sexual. Talvez os psicólogos e psiquiatras discordem de mim, mas, se um extraterrestre chegasse hoje à Terra, não soubesse quem é esse tal de Lewis Carroll e lesse Alice no país das maravilhas, sequer levantaria a suspeita de pedofilia a partir dessa obra.
Já quanto ao potencial consumo de ácido… bem, não posso garantir nada quanto a esse mal-entendido. ;p
A escultura de Alice no Central Park
Em uma breve passagem por Nova York, em janeiro de 2020, atravessei o Central Park inteiro para conseguir visitar a escultura de Alice no país das maravilhas. Sempre achei que fosse algo em homenagem ao autor (tipo a do John Lennon que é em homenagem à obra do cantor), mas é, na verdade, arte em memória de uma senhora que amava as crianças.
A escultura, que deve ser de bronze (não sou entendida do assunto e não tinha ninguém para perguntar) é gigantesca. Dá pra subir e tirar foto em cima dela. Fica na saída do Central Park para a E 74 St., próxima a um playground.
É uma boa experiência para quem é fã de livros, no geral, e principalmente para quem é fã da obra de Lewis Carroll. Mas não há muito o que fazer por lá além de admirar a arte e tirar algumas fotos.
Minha próxima parada no país das maravilhas de Alice é ler a edição em português, que saiu pela Darkside Books no ano passado. Comprei a minha em pré-venda, que me garantiu uma série de presentes, como marcadores e um caderninho, além do próprio livro, que tem um design gráfico singular.
Volto nesse texto, no futuro, para atualizar minha percepção sobre essa parte tão importante da literatura britânica. Afinal, depois dos 30, é bom a gente revisitar algumas obras que marcaram a infância para que possamos ver se ainda sentimos por elas o encantamento da primeira vez.
O que você acha?
Na verdade tenho por hábito reler muitos dos livros que lí na infância e adolecência,pois foi uma época em que lia muito,porém não tinha a devida percepção…atualmente com a minha idade,tenho percepção de sobra… ;p