O segredo da longevidade

Se um dia eu for bem velhinha e me perguntarem o segredo da longevidade, vou dizer que é fazer o que ama. Mas não estou falando de fazer o que ama no trabalho, como as pessoas que falam “ame seu trabalho e não passará sequer um dia trabalhando, não vai nem precisar tirar férias”. Acho isso um absurdo. Sim, seu trabalho pode ser super divertido e você pode estar muito feliz nele, mas ainda assim é um trabalho, no qual você precisa focar e do qual deve, sim, tirar férias pelo menos uma vez ao ano.

E não me venha citar o filósofo que teceu essa pérola. O cara era filósofo. O trabalho dele era pensar e, de vez em quando, escrever algo. É claro que ele amava o que fazia e, pra muita gente, ele não trabalhava mesmo.

(Se você é músico, ator, professor ou social media com certeza já ouviu “tá mas você faz o que DE VERDADE?”. Pode apostar que Platão ouviu isso demais)

Voltando ao assunto, não vou dizer que é amar o trabalho, ou somente o trabalho, mas também e, principalmente, a vida. E fazer o que ama é decidir na quarta-feira no almoço que quer fazer um risoto e, só nesse dia, esquecer que risoto é uma comida chique de jantar e fazer o bendito pra comer com um pedaço de carne que sobrou do dia anterior.

Fazer o que ama também pode ser ir ao estádio de futebol de vez em quando, escolher os filmes que você quer ver no cinema, se presentear com algo gostoso a cada vez que supera uma meta ou tem que fazer um sacrifício.

Pra ser feliz deveria estar liberado comer um bombom por dia, porque não é possível que o seu metabolismo super trabalhado na dieta e na academia não consiga lidar com um. Bombom. Por. Dia.

(Isso não significa que pode um bombom por dia, uma cerveja por dia, um refri por dia, um Big Mac por dia e uma cenoura ralada por dia pra compensar. Primeiro porque tudo na vida é questão de prioridade e cada escolha é uma renúncia. Segundo porque, se você ceder ao combo “bon vivant gourmet”, conhecerá a alegria de viver por, no máximo, 20 anos.)

Bom, voltando – de novo – ao assunto, você tem que fazer o que você ama. Se é se apaixonar, tem que fazer. Se é ter filhos, tem que fazer. Se for encher o saco das pessoas no Facebook o dia inteiro, tem que fazer. Se é rir da própria desgraça, tem que fazer. E dane-se o que os outros pensam. Uma vez ouvi algo legal enquanto fazia mochilão em Amsterdam: se não está ferindo, ou fazendo ferir, alguém; se não está ferrando com o bem estar econômico do próximo; e se não está atrapalhando o bem estar econômico do país, arrasa.

Como diria Raul,

faça o que tu queres, há de ser tudo da lei.

Mas apenas fazer o que se ama não basta.

Se um dia eu for bem velhinha e me perguntarem o segredo da longevidade, vou falar que é fazer o que se ama acompanhado de estar sempre longe da confusão.

Veja bem: não é longe do perigo. Alguns perigos são ótimos. Tipo pular de para quedas. Já confusão… toda confusão é algo particularmente ruim.

Não se meta em triângulos amorosos, porque isso dá confusão.

Depois de 22h baixe o som educadamente e deixe os vizinhos dormirem, senão dá confusão.

Tentar puxar o tapete do seu colega de trabalho? Confusão na certa.

Falar mentira, prejudicar alguém ou vagar por aí às 3h da manhã como se fosse o dono da rua (ou da lua, como diria o Cebolinha) são três formas infalíveis (como gostaria o Cebolinha) de arrumar confusão, barraco, gritaria, dor de cabeça e prejuízo.

O Ministério da Saúde e Longevidade adverte: se persistirem os sintomas de babaquice aguda, um plano funerário deverá ser consultado.

Tudo bem, algumas confusões são inevitáveis. Se apaixonar pela pessoa errada (ou certa que está com uma terceira pessoa errada). Estar no sinal e ver uma arma batendo na sua janela. De vez em quando a confusão acontece, e é muito chato. Mas basta fazer o que você ama para sair dessas confusões com sobrevida garantida.

Ainda tem muita coisa pra acontecer.

Você pode morrer atropelado, nunca encontrar um grande amor ou ter uma doença genética irreversível, coisas que fogem completamente ao seu controle. Mas essas oportunidades de dar tudo errado só acontecem para quem, bem, está vivo. Quando você morrer, pode ter certeza de que todas as coisas ruins vão ter ficado pra trás! ;p

Se um dia eu for bem velhinha e me perguntarem o segredo da longevidade, direi que é fazer o que ama e evitar entrar em confusão. Enfrentar os medos, o sofrimento, a dor, os perigos aos quais estamos todos sujeitos da porta de casa pra fora (ou até pra dentro) faz parte do pacote.

Acredito que só é longevo quem entende que a vida é feita de momentos a serem celebrados, aceitos ou, no mínimo, tolerados. Ninguém deixa de viver por ter chorado demais, ter lutado demais, ter feito demais o que queria, ter se afastado o máximo possível de toda e qualquer confusão. Escolher o oposto de tudo isso é ser breve.

Uma pessoa pode ser longeva e morrer com 5 anos de idade ou ser breve e morrer com 108. Pode parecer estranho ouvir isso, mas, pra mim, longevidade não é sinal de tempo. É intensidade, é vida. E, acredite, tem muita gente por aí que passa a vida tentando ser breve. Não vive, não espera pelo melhor, não imagina se um dia será bem velhinho para ser entrevistado sobre sua opinião quanto ao segredo da longevidade.

Tem muita gente por aí que, de tão breve, apenas existe.

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