O talentoso Ripley

Tom Ripley é um vigarista por força das circunstâncias. A narrativa de O Talentoso Ripley começa com ele se passando por um agente da receita federal que tenta tirar dinheiro dos desavisados que nada entendem de imposto de renda. Afinal, esse é o primeiro dos muitos adjetivos do talentoso Ripley: ele é muito bom com números.

Um dia, em um bar, um homem se aproxima com uma requisição esquisita. Em linhas gerais, ele quer que Tom vá à Europa para convencer seu filho, Dickie, a voltar para os Estados Unidos. Enquanto algumas pessoas já desconfiam das atitudes esquisitas do pseudo-contador, esse homem, que se chama Sr. Greenleaf, vai pagar todas as despesas de viagem para que o jovem traga o filho pródigo para casa.

No caminho da Europa, na primeira classe do navio, temos um vislumbre do que Tom realmente quer: sair da vida de crimes e enganações. Crescendo com uma tia que sempre o colocava para baixo e o desmotivava, e cansado de se decepcionar com os quebra-molas da vida em Nova York, ele decide que a viagem será um novo começo.

Após cumprir a missão de convencer Dickie a voltar para os Estados Unidos, ele vai achar um emprego na Europa e viver longe dos trambiques norte-americanos. Com o coração cheio de esperança em um futuro melhor, nada pode dar errado, certo?

Nem tudo é o que parece

Chegando na Itália, Tom desenvolve uma amizade com Dickie e Marge, sua namorada americana, passando até a viver com eles na mesma casa. Só que, aos poucos, Dickie vai percebendo que não está tão confortável quanto gostaria com a presença desse “novo amigo”, e Tom Ripley percebe que está sendo deixado de lado de propósito.

Acontece que, agora, ele se acostumou àquela vida boa e não quer sair da Europa antes que seja estritamente necessário. Vendo que se parece fisicamente com o americano que deveria voltar para casa, Tom começa a fantasiar como seria ter a vida de Dickie, como seria ser Dickie, e chega a conclusão de que ele mereceria uma vida daquelas.

É aí que o bicho começa a pegar.

Enquanto Dickie e Marge acham que Tom está obcecado de paixão pelo americano rico, Ripley está, na verdade, tramando sua morte. Literalmente sua morte: ele quer pegar o lugar, a identidade e a riqueza de Dickie. 

Embora a trama se passe em uma época onde isso é possível, já que não há tecnologia de DNA, reconhecimento facial ou redes sociais para desmontar esse tipo de falsidade ideológica, é óbvio que uma troca de lugares assim vai gerar problemas. Tom passa a relativizar os percalços com cuidado, mas não desiste da ideia de assumir outro papel em sua própria trama. 

O poder do adjetivo em O Talentoso Ripley

Essa parte do texto vai conter revelações sobre o final da história; por isso, se você ainda não leu o livro ou viu o filme, e quer fazer isso, saia desse texto e só volte para discutir os finalmentes.

Vou até deixar aqui uma foto do Matt Damon como Tom Ripley pra você ter tempo de sair sem ver algo que não queria.

Avisos dados, vamos lá.

Esse é um livro que começa bem, assume uma lentidão momentânea, mas pisa no acelerador e vai assim até o final. Quando Ripley mata Dickie e assume sua identidade, vemos seu castelo de cartas começar a ruir lentamente. As pessoas que conhecem Dickie e ele, como Marge, sabem que eles não são a mesma pessoa.

Os bancos começam a desconfiar que as assinaturas nos cheques de Dickie não são de fato dele. O barco em que o assassinato ocorreu é encontrado, e Tom “precisa” cometer outro assassinato para se manter anônimo enquanto o círculo se fecha cada vez mais. 

E é bem no finzinho mesmo que descobrimos porque ele é tido como um homem talentoso: de alguma forma, ele consegue se desviar de todos os obstáculos capazes de colocar o plano dele a perder, e até ganha a herança de Dickie – do dinheiro aos pertences, como relógios e joias, inclusive um anel que quase coloca seu plano abaixo – sem que os Greenleaf vejam a menor suspeita nessa trama toda.

Esse final me surpreendeu muito – eu jamais pensei que ele sairia impune e tá tudo bem. A sensação vem, justamente, dessa necessidade de que ele encontre rapidamente saídas para a própria mentira, já que quase sempre está a ponto de ser pego no ato. 

Dessa parte eu gostei muito; não teve resolução óbvia ou em sentido para fazer com que a história de Ripley fosse uma boa história. Estou curiosa para ver se, no filme, esse final (inesperado, pelo menos para mim) foi preservado.

Pra finalizar, vale lembrar que O Talentoso Ripley faz parte da minha biblioteca feminista. Escrito por Patricia Highsmith em 1955, o romance policial é um dos mais aclamados do gênero, para o qual foram feitas duas adaptações cinematográficas: O Sol por testemunha, de 1959, estrelado por Alain Delon, e O Talentoso Ripley, com Matt Damon, de 1999.

Antes de sair…

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