Se no primeiro livro das Crônicas Saxônicas Uhtred relata os primeiros anos da sua vida com os dinamarqueses, em que vemos sua transformação de criança a jovem guerreiro, no segundo livro, O cavaleiro da morte, o saxão começa a mostrar seus primeiros passos como homem – segundo ele mesmo diz, arrogante, imbecil e cabeça dura, o que o leva a cometer vários erros.
Após vencer o combate contra os vikings, quando matou o guerreiro Ubba em uma luta em Cynuit, o jovem de Bebbanburg achou que conquistaria o respeito e o apoio do rei Alfredo. Mas, com palavras e atitudes tomadas por impulso, ocorreu justamente o contrário.
Este texto está recheado de spoilers! Se ainda não leu a obra, a gente te dá um tempo pra fazer isso e voltar pra conferir a resenha. 😉
Nas primeiras páginas, Uhtred deixa claro todo seu ódio pelo rei de Wessex. Enquanto ele enfrenta os adversários em uma parede de escudos e arrisca a própria vida para defender um reino que não é seu, Alfredo acredita ter vencido a batalha devido a Deus, o que o deixa revoltado e aumenta sua raiva contra o rei e o cristianismo. O sentimento por parte do monarca é recíproco, e este logo deixa claro essa condição, impondo ao jovem saxão humilhações e castigos.
Assim como no primeiro livro, e creio que este será um tema até o fim da saga, muitos questionamentos são feitos sobre o cristianismo. O autor mostra uma relação de interesses econômicos e de poder entre o rei e os líderes religiosos. É como se a igreja usasse toda sua influência em benefício próprio, acumulando riquezas, construindo templos e deixando seus membros ricos e vivendo com luxo e conforto num período de muitas guerras e miséria. Há, por parte dos sacerdotes, uma manipulação, sútil, sobre o devoto rei de Wessex.
É bom lembrar que Bernard Cornwell é ateu e tem uma visão bem particular quanto a qualquer manifestação religiosa. Veja aqui uma entrevista dele ao Grupo Editorial Record, feita por Eduardo Spohr sobre esse e outros assuntos.
Além disso, mesmo escrevendo uma história fictícia, Cornwell tem como fonte de inspiração fatos históricos. Portanto, o leitor deve manter uma postura crítica e buscar também suas fontes de pesquisa. Mas, sem dúvidas, as provocações quanto ao tema, não apenas em relação ao cristianismo, mas a todas as manifestações religiosas que se apresentavam naquele período, são pertinentes e podem ser experimentadas ainda hoje.
Voltando ao livro, desde a vitória na batalha de Cynuit, uma trégua negociada entre Alfredo e o dinamarquês Guthrun foi estabelecida. Uhtred, então, volta a Defnascir e à vida que não desejava. Casado com Mildrith, um compromisso que lhe deu uma dívida junto à igreja impossível de pagar, teve diferença ideológica em relação à religiosidade da mulher, extremamente devota e contra as crenças pagãs. O tédio de uma vida pacata fazia crescer nele o desejo de reconquistar o que lhe fora tirado pelo tio.
Com o propósito de se juntar novamente aos dinamarqueses na companhia do irmão Ragnar, o jovem – sem poder – Uhtred reconhece suas limitações e começa a traçar estratégias para enriquecer e conquistar seguidores. A finalidade é ter seu próprio exército e alcançar seus objetivos; dentre eles, lutar pelos saxões, mesmo identificado com a cultura dos dinamarqueses.
A bordo de um dos navios da frota de Alfredo, junto com Leofric, parte rumo à Cornualha para realizar saques. Ora lutava contra britânicos, ora contra dinamarqueses. As alianças eram feitas e desfeitas para atender sua necessidade de enriquecer. Ele impõe aos nórdicos, homens e mulheres, que saiam das suas terras livres. Aos ricos, resta dor e sofrimento. Eles eram assassinados, violentados e escravizados. Saíam da riqueza para a miséria.
Nessa aventura ele conhece Iseult, uma espécie de bruxa, figura que representa as crenças pré-cristianismo e era cultuada pelos britânicos, povo que vivia em Gales e inimigo dos saxões. Ao voltar para sua casa em Desfnacir, além da riqueza conquistada nas batalhas, Uhtred leva, também, a mulher por quem se apaixonou.
Enquanto o rei Alfredo, monges e todos os crentes acreditavam que Deus tinha tocado o coração dos dinamarqueses, e que a paz reinaria, Uhtred se preparava para um novo ataque inimigo. Construiu seu castelo, conquistou a confiança de alguns homens e os treinava para a luta. E, como imaginava, uma vez que conhecia bem a cultura danês, o período de paz acaba quando Guthrun quebra a palavra dada ao rei, reunindo seus homens e atacando novamente o reino de Wessex.
Com o duro golpe sofrido, o território fica em risco e leva o rei Alfredo a se esconder num pântano. Muitos de seus aliados são destinados ao exílio. E, de onde menos se espera, vem a salvação – e não de Deus ou de algum dos santos adorados por Alfredo. Quem salva o rei e sua família é Uhtred, ao encontrá-los na região. Nesse momento, mesmo com todo o ódio que sente pelo monarca, se torna o responsável por protegê-lo e o auxilia na montagem de um novo exército para tentarem, em uma única batalha, reconquistar o território perdido.
Enquanto esperavam a reunião dos homens convocados a formar o exército de Wessex, Uhtred reencontra o sobrinho do rei e conhece outras pessoas que se unem ao grupo.
Finalmente chega o dia do confronto e, em número menor que a tropa dinamarquesa, Alfredo e seu exército partem para uma batalha violenta, com muitas perdas para os dois lados, em especial para Uhtred.
O resumo do segundo livro é: entendendo que, para reconquistar o que é seu por direito, que foi tomado pelo tio que serve aos dinamarqueses na Nortúmbria, Uhtred precisava ter o apoio dos saxões. Por isso, mesmo com todo ódio que sente por Alfredo, Uhtred o socorre e luta ao seu lado.
São apresentados novos conflitos históricos da época, como a rixa entre britânicos e saxões, bem como a adoração da cultura pagã e seus deuses e crenças, figuras existentes pré-cristianismo na região de Gales.
E, quando parecia que os dinamarqueses conquistariam o último reino inglês, tomando conta de quase todo o território, Alfredo, o Grande, consegue se reerguer e manter o sonho de construir uma Inglaterra unida, como a conhecemos atualmente.
[…] Além da narrativa que o autor usa para encantar e prender nossa atenção, ele deixa notas históricas ao fim de cada livro, o que torna tudo mais interessante. Nesse, confirma a trégua, acordada entre […]