Dica de leitura: Extraordinárias

“Sofri e chorei”: é isso o que está escrito na lápide de Chiquinha Gonzaga, musicista brasileira. Ressoa a vida de milhares de mulheres ao redor do país e do mundo, famosas ou não. Mas está longe de ser o resumo dessas vidas, o resumo do que somos na condição de mulheres.

Se sofremos e choramos ao longo da vida, também sorrimos, fazemos sorrir e chorar, escrevemos história. Cada uma a sua maneira, dezenas de mulheres que você conhece, centenas na sua cidade e milhões espalhadas pelo planeta estão fazendo a diferença, hoje, com o que sabem. Iletradas ou doutoras, crianças ou senhoras, declarando-se feministas ou não, as mulheres carregam o poder de ressignificar seus sentimentos, transformá-los em luta e, simplesmente, lutar.

E, se nunca tivemos a obrigação de nos alistar no exército, não há razão lógica para pensar que não poderíamos. Mulheres lutam como mulheres e, no amor e na guerra, conquistam tanto quanto os homens.

A falta de holofote para esses merecidos feitos é o ponto de partida de Extraordinárias – Mulheres que revolucionaram o Brasil. Para entender qual é o papel da mulher na sociedade, Duda Porto de Souza e Aryane Cararo, as autoras do projeto, nos dão um panorama da vida de mulheres que fizeram do Brasil um país forte e rebelde, desde a colonização portuguesa aos dias de hoje.

As mulheres que o livro descreve fizeram história nas lutas armadas, na ciência, na arte, na educação, na militância lésbica e feminista, no poder público, na religião. Ou seja, em todos os círculos sociais possíveis. Contudo, por um ato falho da descrição dos anos, foram “esquecidas”, relegadas a postos inferiores a de homens que, às vezes, fizeram bem menos do que a mais modesta delas.

O livro já chama a atenção pela capa holográfica. Quando carregava no carro, durante o dia, tinha que deixá-lo sempre aberto para não correr o risco de incomodar o motorista com o reflexo do sol. Isso, de certa forma, nos dá algo a pensar: as mulheres que estão retratadas ali – não apenas nas palavras, mas, também, nas ilustrações, todas feitas por mulheres – incomodavam. E ainda incomodam, cada qual da sua forma.

Todo mundo que quer se contrapor à luta feminista vai achar o livro “mais chamativo do que deveria”, mas as pessoas que disserem isso não estarão certas. Quanto mais Extraordinárias chamar a atenção, melhor. Nunca será demais. Precisamos saber a linhagem de mulheres fortes que nos antecederam para criar um caminho cheio de conquistas para as próximas gerações.

Desconhecer a história das brasileiras que fizeram o passado por nós é não dar o devido valor ao que temos hoje. E, sem compreender o que isso significa, dificilmente conseguiremos nos resolver nas discussões sobre os privilégios, de homens em relação a mulheres ou de algumas mulheres em relação a outras.

Mas a capa não é o que mais chama a atenção: o conteúdo, as histórias, brilham tanto quanto. Uma das que mais me marcaram foi a de Leila Diniz, que eu conhecia da foto de biquíni na praia enquanto estava grávida, e só. Você imagina uma mulher de 32 anos sem saber quem era Leila? Pois é. Lembro que alguém já tinha dito que ela era ousada, mas nunca fui a fundo em sua história.

Depois de ler Extraordinária, pesquisei um pouco mais sobre Leila e diversos outros nomes que tomaram minha atenção. Maria da Penha, por exemplo. Ela é tão maior do que eu sabia sobre ela antes! Carolina de Jesus, Dandara, Cacilda Becker, Berta Lutz… a minha preferida da lista, Marta… o livro quebra a barreira do desconhecimento, nos traz pra perto desses nomes maravilhosos e nos mostra que somos o que somos porque tivemos um passado repleto de mulheres incríveis fazendo acontecer.

Por que parar agora?

Antonieta de Barros, “uma mulher a serviço da educação”, como descrita em Extraordinárias, dedicou um de seus livros às mulheres importantes de sua vida, dizendo

À minha mãe, a grande amiga que não morreu, e à minha irmã, saudade, gratidão e amizade”.

Embora ela tenha tido uma irmã, uma pessoa específica a quem fazer a dedicatória, tomo a licença poética de enxergar a mim, e a qualquer outra mulher, a irmã a quem Antonieta oferta gratidão e amizade.

As mulheres se juntaram, cada uma de comum acordo com a próxima. Deram-se as mãos, e isso não tem volta. Somos irmãs e devemos nos dedicar gratidão e amizade a cada passo do caminho, para que estejamos sempre prontas para a luta – e para que a luta esteja sempre à nossa altura.

3 Comentários
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    Lari Reis at 10 de junho de 2019 Responder

    Tá na minha lista! Ainda não sei quando lerei… Por ora, estou tentando decidir se compro a versão impressa (pela capa) ou se pego a edição para o kindle mesmo.

    Vou aproveitar e contar que estou tentado criar um sistema não muito rigoroso para definir que tipo de leitura vou fazer no e-reader e qual merece ou pede o papel.

    Aquelas que sei que farei muitas anotações ou que vou querer consultar com frequência são papel. As outras, tendem a ir para o kindle. Tendem porque, sabe-se lá por qual razão, comprei um Neil Gaiman impresso essa semana. Não faz sentido dentro desse sistema que estou montando, mas rolou!

    1. avatar image
      Lais Menini at 18 de junho de 2019 Responder

      A capa vale a compra! E se quiser fazer um texto sobre esse sistema pra gente postar por aqui, será super bem-vindo! 😉

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